Enfrentar a mortalidade de jovens negras e negros só com Juventude Viva é enxugar gelo

 

Por Dennis de Oliveira

 

Necropolítica é o conceito proposto pelo pensador camaronês Achille Mbembe. Significa a gestão de territórios de degradação, desintegração social e morte. No Brasil, estes territórios são as periferias. Processos de degradação e desintegração social tornam a morte provocada uma situação naturalizada. Seja pelos assassinatos cometidos por agentes legais e extra-legais, seja como produto da própria degradação social expressa pela ausência de condições mínimas de sobrevivência, como falta de saneamento básico, saúde, alimentação, entre outros.

A população destes territórios periféricos tem cor: são negras e negros os que habitam, majoritariamente, estes lugares. São eles as vítimas da necropolítica.

São negras e negros que se transformam em vidas afastadas da política. A questão racial fica, assim, sempre periférica nas narrativas políticas.

É isto o que se verifica no governo golpista de Temer.

Primeiro, o governo golpista nomeia um ministério todo de homens brancos. Depois, chama algumas mulheres para preencherem cargos de segundo escalão. Finalmente, coloca uma mulher negra na Seppir, agora rebaixada como uma secretaria subordinada ao Ministério da Justiça.

E quem é o ministro da Justiça? Simplesmente um dos que foram os principais comandantes da política de extermínio da periferia no estado de São Paulo.

No último boletim da Seppir nacional, informa-se que a secretária de igualdade racial, Luislinda Valois, reuniu-se com o secretário da juventude, Bruno Santos, para pensar ações de combate a violência que vitima os jovens negros das periferias.

A proposta é reativar o Programa Juventude Viva. Segundo o boletim da Seppir, “(o programa) atua na articulação e direcionamento de programas e ações específicas para os jovens de 15 a 29 anos em situação de vulnerabilidade para fomentar trajetórias de inclusão e autonomia, além de criar oportunidades de atuação dos jovens em ações de transformação da cultura de violência e reconhecimento da importância social da juventude.”

Em outras palavras, o foco de atuação no combate a mortalidade de jovens na periferia está no próprio jovem. Como se ele fosse o único responsável pelo extermínio.

Claro que uma secretaria subordinada a um ministério comandado por uma pessoa que defende a ação violenta da polícia não poderia ir muito além disto. As forças repressivas estão certas, as vítimas é que precisam mudar o comportamento, é a lógica de uma ação como esta.

Não que não seja importante defender políticas públicas para a juventude. Mas considerar que são o caminho para resolver o problema do extermínio é uma inversão de raciocínio.

O extermínio é produto da necropolítica de Estado.

Necropolítica aplicada porque o projeto neoliberal deste governo tende a concentrar ainda mais a renda e reduzir as políticas sociais, aumentando a miserabilidade e, com isto, piorando ainda mais os territórios de degradação e desagregação social. E a morte, inclusive.

Dissociar o enfrentamento do racismo das questões estruturais é manter a discussão racial na periferia do debate político.

Texto publicado originalmente em: http://goo.gl/fAWZLK